Nada

Minha primeira leitura de 2019 foi Nada, primeiro vencedor do prêmio Nadal, considerado uma das obras espanholas mais importantes do século XX. Currículo de peso, não? Carmen Laforet tinha apenas 23 anos quando escreveu este romance – o que me fez pensar muito sobre o que estou fazendo com a minha vida, já que aos 24 anos o que eu fiz? Nada de relevante, nem um prêmio Nadal ganhei.


Comecei sem grandes expectativas, porque a sinopse parecia bem comum, o enredo não prometia grandes reviravoltas, dramas ou aventuras. Porém o primeiro capítulo me capturou, não tanto pelo enredo, mas pelo estilo da autora e pelos personagens. As descrições que Andrea, personagem-narradora de Nada, faz são tão maravilhosas que chegam a ser poéticas.

Fonte: TAG Curadoria

Andrea é uma jovem órfã de 18 anos que passou grande parte de sua vida no interior e tinha o sonho de morar para Barcelona. O ingresso na faculdade para cursar letras foi a oportunidade perfeita para a jovem se mudar à metrópole tão idealizada, e o modesto apartamento de sua avó materna, na rua Aribau, passou a ser sua casa.

Cheia de personagens excêntricos, consumidos pela falta de luz, longos jejuns e a pobreza extrema deixada pela Guerra Civil, a casa da rua Aribau é sombria e abarrotada, cheia de móveis velhos, animais e pessoas com vidas miseráveis. Velha, úmida e suja, a construção vem sendo nitidamente consumida pelo tempo e pelas emoções de seus moradores. A casa da rua Aribau, aliás, é uma personagem única, uma vida a parte!

Na rua Aribau moram a avó; tia Angustias; tio Juan com sua esposa, Glória, o filho deles; tio Román, uma velha empregada, um cachorro roliço e um papagaio resmungão. A avó, mesmo ficando senil pela idade, é a personagem mais sóbria da casa. Román é manipulador e envolvente; Juan parece encarnar as sequelas da Guerra Civil Espanhola, com seu temperamento volátil, agressividade e verdades.

Andrea é uma personagem passiva, sem grandes sonhos para o futuro, o que incomodou muito em algumas partes do livro, mas não atrapalhou a leitura, já que a vida dela é a parte menos interessante do livro. Seu maior sonho era a liberdade, que buscou indo para Barcelona e não encontrou, uma vez que sua tia Angustias lhe tolheu as asas. Tia Angustias, aliás, me parece ser personificação de uma denúncia à hipocrisia e ao fingimento religioso, já que ela adora julgar os outros.

Após a partida da tia, Andrea se imagina finalmente liberta, porém a falta de dinheiro não permite que ela viva de acordo com os padrões da universidade, local frequentado pelos herdeiros de maior renome e prestígio de Barcelona, com vidas hipócritas e relações falsas.

Não espere um enlace amoroso, não ocorrerá. Há uma tensão amorosa entre Andrea a seu tio Román logo no início e, quando a jovem se torna amiga de Ena, ela também parece amar platonicamente a amiga.

A leitura é fluida e o estilo extremamente envolvente e, mesmo não tendo um enredo cheio de reviravoltas e mistérios, a rua Aribau consegue te prender, assim como prendeu Andrea e o livro fica marcado.

Obra bem Naturalista, a descrição do apartamento e dos personagens da obra me fez lembrar de O Cortiço. Se você gosta do estilo, você amar Nada!

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